Scotland, ye bonnie land V

Isle of Skye: Quiraing ao longe e scones metafísicos

Depois de descermos novamente o trilho do Old Man of Storr, exaustas, sobretudo devido ao vento que se fazia sentir na descida e que nos obrigou a exercitar todos os músculos do corpo para não perder o equilíbrio, famintas e geladas, a aventura seguinte foi mesmo encontrar um sítio aberto onde fosse possível comer qualquer coisa e aquecermo-nos um pouco - devido ao avançado da hora (pouco passando das 15 horas), ao facto de ser sábado e de Skye, à excepção das poucas cidades e vilas, ser uma ilha bastante deserta, ponteada maioritariamente por pequenos povoados ou cottages isoladas. Encontrar alguma coisa aberta àquela hora da tarde provou ser mais complicado do que subir montanhas. O pequeno-almoço, embora farto, já tinha sido há demasiadas horas e os snacks alimentam mais a alma do que o corpo, sobretudo a raparigas de muito sustento como nós. 






Pelo caminho, contudo, ainda fomos piscar o olho ao Quiraing, um impressionante deslizamento de terra no cume mais ao norte do Trotternish, o Meall na Suiramach. Sabíamos que não iríamos ter tempo para fazer os trilhos desta vez, mas não quisemos deixar de lá passar a dizer um olá e até breve. E ainda bem que assim foi: o Quiraing é completamente arrebatador e toda a zona envolvente merece, no mínimo, uma visita de passagem. Ficou uma enorme vontade de voltar, subir e dar a volta completa, observando do alto as paisagens de tirar o fôlego que tínhamos à nossa frente. Como se já não tivéssemos motivos suficientes para voltar assim que possível. 








Muitas voltas e bastantes quilómetros percorridos mais tarde, depois de alguns rebates falsos e um simpático velhinho que nos garantiu haver um hotel um pouco mais abaixo, entramos numa belíssima propriedade beijada pelo mar inquieto. Ao fundo, um pequeno e charmoso hotel parecia aventurar-se solitário contra todas as intempéries, rodeado por um jardim encantado e as estátuas de dois veados que fitavam o mar eternamente. 
Na parte lateral do edifício, uma pequena porta semi-aberta deixava antever um balcão e um senhor em mangas de camisa e boina de tweed verde sentado com um copo de cerveja na mão - sinal inequívoco de que, à falta de outra coisa, pelo menos calorias líquidas haveríamos de conseguir ingerir. Nem tudo estava perdido! 








Já lá dentro, o balcão abriu caminho para um acolhedor pub, agradavelmente decorado, numa mistura de elementos campestres e marítimos. Quase todas as mesas estavam ocupadas, mas o ambiente era tranquilo e no ar havia uma criteriosa selecção musical, acompanhada pelo crepitar da lareira e um coro de vozes em volume baixo. Parecia o cenário de um filme, o local ideal para uma pausa na nossa road trip e para recuperarmos energias.
Amavelmente, foi-nos dito que a cozinha já estava fechada mas que nos poderiam servir uns scones quentes, com compota e clotted cream. Pedimos uns capuccinos para acompanhar. O que nos chegou à mesa foi um manjar dos deuses - e assim se transformou um simples lanche numa memória gastronómica muito feliz. 


A Ilha de Skye possui uma magia especial e uma energia muito particular, que nos apazigua e inquieta, ao mesmo tempo. Como se cada monte e vale, cada lagoa e cada pedra viradas para o mar nos interpelassem e nos colocassem questões muito antigas, cujas respostas, para as conseguirmos encontrar, nos obrigam a escavar bem fundo dentro de nós. Fazer quilómetros naquelas estradas quase desertas, acenando e sorrindo em forma de agradecimento a quem, nas estradas de via única, se via obrigado a parar em cada passing place, é uma forma de terapia, de descoberta e de auto conhecimento profundo. Uma grande parte da minha alma fitará para sempre (desde sempre?) o mar frio daquela ilha e as cores esbatidas das suas paisagens. Uma boa parte de mim ficou lá mas voltei mais inteira do que nunca. 






(continua...)

Sem comentários:

Enviar um comentário