Scotland, ye bonnie land VII


A estrada que atravessa Dunvegan, o castelo visto de longe e a tristeza amainada num mar de coral.





Amanhecemos angustiadas, com um nó imenso no peito e a certeza do que precisava ser feito. Sabíamos que a Ji tinha poucos dias de vida e que tínhamos que chegar a Portugal o mais depressa possível. Passamos a manhã literalmente às voltas dentro de um supermercado - o único sítio onde conseguimos wifi, pois nem o 3g estava a funcionar. Comprar bilhetes para o Porto revelou-se tarefa quase impossível. Teríamos que voltar a Londres, pois não conseguimos vôo directo, e daí voar para Faro. Aí, apanharíamos o comboio até ao Porto. Os próximos dias iam ser longos e duros, física e emocionalmente - mas a melhor forma de honrar a vida da Judite, como ela mesma nos pediu, era aproveitar cada dia ao máximo. Assim tentamos fazer, fintando as lágrimas .




E como a Ji teria gostado de tudo o que vimos ali, naquela ilha abençoada. Sei que se teria divertido com os rebanhos de ovelhas que congestionam as estradas estreitas tanto quanto nós nos divertimos e que teria apreciado a mudança na paisagem a cada curva, monte após monte.





Estávamos a precisar de horizontes largos, paz e sossego naquela manhã já demasiado longa. Percorremos a estrada de Dunvegan e chegamos a parar junto ao Castelo, mas decidimos apenas fazer uma pequena pausa para café e seguir viagem, vendo apenas o edifício imponente de fora, junto ao lago. Uma luz cinzenta, com traços prateados sobre a água, convidava a um passeio pelas margens rochosas. O contraste das rochas pretas com as flores, sobretudo amarelas, que pintalgavam a paisagem à nossa volta, conferia um ar nostálgico ao cenário centenário.





De seguida, rumamos até à Claigan Coral Beach. Uma praia de águas cristalinas e corais era mesmo tudo o que podíamos pedir naquele início de tarde. Tínhamos lido que era uma das mais bonitas da ilha e, também por isso, uma das mais visitadas. Apesar de não nos apetecer muita confusão, resolvemos arriscar - e ainda hoje agradeço a todos os deuses que nos ajudaram a tomar essa decisão.
No início do trajecto que nos levaria à praia, uma pequena manada de vacas, algo dispersas, davam as boas-vindas a quem se atrevia a fazer o caminho dali para a frente. Curiosas q.b., mas sem nos darem muita confiança, continuavam a sua vida enquanto posavam para as fotografias, como quem não quer a coisa.






O caminho até à praia, apesar de algo sinuoso, não é de dificuldade demasiado elevada. Vale cada passo e a vista sobre a praia é de tirar o fôlego. De repente, um areal dourado, repleto de conchas e corais e um mar de águas transparentes e cristalinas aparece à nossa frente como o cenário de um filme em paragens distantes. Ouvem-se ruídos estranhos vindos da água e a ondulação mais agitada faz perceber a presença de curiosos e inquisitivos pares de olhos a espreitar por entre as ondas: focas, muitas, a nadar e a brincar e a perguntar "mas o que raios fazem vocês aqui?!". Ganhamos o dia naquele momento e foram a companhia perfeita para um piquenique na areia fria. Pessoas, graças aos deuses, não havia em demasia. Uma família francesa com cinco filhos em escadinha, que desfrutaram da praia como crianças felizes, livres e soltas e uma mão cheia de outros visitantes que se estenderam pelo areal quase sem darmos por eles. De resto, só mesmo o barulho do rebentar das ondas, o vento que encanava nas rochas e as nossas novas amigas, que apesar do frio, continuavam a dar piruetas na água gelada.






Querida Ji:

Cumprimos o prometido - aproveitamos cada instante. Estiveste lá sempre connosco, sei que o sentiste, também. Tive a certeza disso quando te dei um beijo, assim que cheguei à tua beira. 

A Mourinha diz que as minhas sopas estão quase tão boas como as tuas. Não uso cubos, mas descasco e corto os legumes com uma faca pequenina, como tu. 

Continuas presente entre nós, para sempre. Sei que estás algures a barafustar com os avós e a cuidar deles, como fizeste com todos nós, a vida inteira. 

Temos saudades tuas. Tantas.


















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