Gloomy days.





As últimas duas semanas têm sido difíceis. Não falo do facto de estar em casa há mais de um mês - estar em casa, sobretudo nesta, cheia de luz, com um jardim onde apetece estar e demorarmo-nos, o confinamento está, logo à partida, muito mais facilitado. Sou uma privilegiada, nesse aspecto, mas também porque estar em casa, podendo definir horários e ritmos, tarefas e rotinas, é algo que se adequa bastante bem à minha personalidade. Desde que o possa fazer por livre e espontânea vontade e nos meus próprios termos - e este é apenas um dos busílis da questão.
Este confinamento imposto, a falta de liberdade de movimentos, a suspensão ou até mesmo supressão da vida como a conhecíamos até este vírus maldito (como diz o meu sobrinho de 6 anos) ter começado, são apenas a ponta do iceberg. Este esforço colectivo que nos têm pedido, apesar de urgentemente necessário, não tenho dúvidas disso, não é um passeio no parque. Nenhum de nós está de férias em casa, livre de problemas e preocupações, a saborear o passar das horas. Há pessoas a morrer lá fora, alguns até serão nossos familiares e amigos, colegas de trabalho ou vizinhos. Todos eles nos tocam de perto porque todos eles, sem excepção, poderíamos ser nós. Há pessoas a perder o emprego, esforços de trabalho de uma vida inteira, literalmente do dia para a noite. Há famílias que não vão aguentar o impacto desta nova realidade e que vão sair disto destruídas. Sonhos que estão a ser adiados, projectos completamente parados e postos de novo na gaveta.
É, acima de tudo, esta instabilidade que está a mexer comigo nestas últimas semanas. O não haver certezas em relação a quase nada, a sensação de estarmos todos a caminhar no arame, sem rede. O não ser possível fazer grandes ou pequenos planos - até mesmo planear refeições, neste momento, obriga a pensar numa série de logísticas e condicionantes a que (já) não estávamos habituados. O não saber quando será possível voltarmos a viajar e as saudades e as emoções que ficam muito mais difíceis de gerir, sobretudo para quem vive fora de Portugal. 
Empregos estáveis, com salários aceitáveis e contas certas ao fim do mês que se tornam excedentários num abrir e fechar de olhos. Economias estagnadas, países inteiros fechados. E uma frase a martelar na minha cabeça há vários dias: “vais ter que te reinventar, mulher. Vamos todos ter que nos reinventar.” As economias vão ter que se reinvertar, o business as usual já não vinha a funcionar há muito tempo. Vamos ter que reavaliar prioridades, começar a investir nas áreas certas e a apoiar as pessoas, antes de pensarmos na economia. A economia somos todos nós e está na hora de nos pormos todos a mexer para termos vidas mais justas e igualitárias. Acho que se deveria encarar toda esta situação como uma espécie de agora ou nunca e começarmos a pintar um futuro melhor - para nós e para os nossos filhos, enquanto ainda há tempo. Tenho sérias dúvidas que seja isso o que irá acontecer.
Nestas últimas semanas tem sido muito complicado focar-me e concentrar-me nas tarefas necessárias e na rotina a que me impus. Ando a dormir mal e isso nunca ajudou a nada, também. Sinto a cabeça cheia e vazia, ao mesmo tempo. Passo horas a tentar desvendar o futuro sem conseguir viver o presente. Vou tendo alguns momentos melhores, mais produtivos. No entanto, não me tenho forçado a nada. A vida ensinou-me que há alturas em que pouco ou nada posso fazer para que este estado de dispersão mental passe. É dar tempo ao tempo, sem desesperar muito. Ir vivendo um dia de cada vez, dando graças pelas pequenas ou grandes coisas que a vida me continua a oferecer, tenha eu sempre capacidade para me aperceber delas e as apreciar devidamente. 
Amanhã será melhor. Ou não. Seja como for, cá estarei para ir à luta. Mesmo que, por vezes, a minha técnica ninja seja enroscar-me na posição fetal em cima da cama até conseguir pensar com clareza outra vez. Ou fazer bolos. São técnicas quase à prova de bala.


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